Meta(o)dologia 5 - Para monumentos: práticas para além de lembrar ou esquecer

Para monumentos: práticas para além de lembrar ou esquecer

Inevitável remontar à discussão sobre os monumentos num momento como esse que estamos vivendo. Essa semana manifestantes derrubaram uma estátua monumental erguida em 1895 em Bristol, que representava um escravocrata. No Brasil esses monumentos sequer são vistos, e suas histórias não são (re)contadas. Existe um processo de amnésia social, que reitera a memória violenta. A banalização da violência neste país é quase inigualável. Como lidar com o que nos agride? Basta relegar essa tarefa à dupla:lembrança e esquecimento?

Segundo Le Goff, no livro História e Memória, “o monumento tem como característica o ligar-se ao poder de perpetuação, voluntária ou involuntária, das sociedades históricas (é um legado à memória coletiva) e o reenviar a testemunhos que só uma parcela mínima são testemunhos escritos”(p. 536). Essa definição é certeira quando nos aponta que a função o tempo do monumento se pretendem perpétuos. O que se deseja perpetuar? Somos obrigados a convivência inquieta que perpetua a morte e a exploração de determinados corpos, não só no universo simbólico.

O monumento é, portanto, um documento. Uma forja entre memória coletiva e a forma científica. Achilli Mbembe, em seu texto “O poder do arquivo e seus limites”, argumenta sobre relação do arquivo com a morte (no texto ele analisa o arquivo enquanto instituição arquitetônica e o arquivo enquanto coleção de documentos, normalmente escritos. No entanto a reflexão a seguir também pode ser mobilizada para o entendimento sobre monumentos):

“Em um nível mais básico, o arquivo impõe uma diferença qualitativa entre a propriedade comum do tempo morto (o passado) e o tempo vivo que é o presente imediato. Essa parte do seu status que é regida pelo imaginário emerge do fato de que ele está enraizado à morte enquanto evento arquitetônico. Uma morte tem de acontecer para que surja um tempo caracterizado pelo fato de que não pertence a um indivíduo específico, precisamente porque esse tempo, a partir daquele momento, funda ou institui alguma coisa. (p.4)”

O monumento enquanto documento, e o documento em status de arquivo. A relação com a morte em seu estado de existência. Se o monumento já nasce pela morte, haveria como “matá-lo” de novo? 

A obra mediada é um vídeo produzido pela artista Nena Callejera. Nesse vídeo ela mata Gilberto Freyre asfixiado (quantas imagens podemos evocar a partir desse ato?). Ela usa esse recurso, de matá-lo, por meio do monumento em homenagem à ele. O que representa Gilberto Freyre? Como seu legado e sua escrita afeta e agride corpos negros neste país?

Como matar esse legado? Como reagimos a essa violência, ou melhor, como podemos reagir a essa violência?

A mediação já estava pronta, e foi justamente o trabalho de arte produzido por Nena Callejera que fez essa função, porque não haveria uma forma mais justa de mediar essa relação, do que questionar sobre como reagimos a essa violência que opera no campo simbólico da memória, mas também na sua efetividade na construção de práticas violentas no seio da sociedade. A dupla morte.

Para acessar a mediação da obra "Eu matei Gilberto Freyre" clique aqui

Reflexões Preliminares
-monumentos e como eles representam uma memória de violência
-como lidar com uma representação material de uma memória de violência?
-Lembrança e esquecimento dão conta dessa tarefa?
-pra quê se erguem monumentos violentos?
-O que fazer?

Referências
Conheça a artista: https://www.instagram.com/nenacallejera/?hl=pt
Deimantas Narkevicius. Uma vez no século 20. Vídeo em DVD. 8 min
Texto de Achille Mbembe:https://narraracidade.files.wordpress.com/2019/03/a05-a-mbembe-achille.-o-poder-do-arquivo-e-seus-limites.pdf
Le Goff, Jacques, 1924. História e memória / Jacques Le Goff; tradução Bernardo Leitão. Campinas, SP Editora da UNICAMP, 1990.

Comentários