Notas sobre a Formação, Produção Teórica e Divulgação Científica dos "arte-educadores museais"

A Educação em Museus já era pauta nas discussões da museologia nos anos 50 do século passado. Evidente que muitos processos se desenrolaram desde então e tomaram forma em outros campos do conhecimento, como Pedagogia e Artes Visuais. Segundo Costa (2019), um dos marcos para essa discussão foi o Seminário Regional da UNESCO, que aconteceu em 1958 no Rio de Janeiro, sobre a função educativa dos museus:

O evento de 1958 é considerado um dos marcos da Museologia e contribuiu para o fortalecimento da educação museal no Brasil. A formação dos profissionais de museus foi abordada de maneira consistente no evento e, por meio da análise do relatório elaborado por Georges Henry Rivière (1960), podemos identificar as principais propostas e os maiores desafios colocados naquele momento à formação de profissionais de museus (...), e de educadores de museus (...). (COSTA, 2019, p. 68)

Hoje o setor se encontra no bojo de uma série de debates sobre sua pertinência, seus desafios e seu papel nas instituições. Os educativos se tornaram a partir do PNM3 uma obrigatoriedade em todos os museus, mas até que ponto, esse aspecto garante a sustentabilidade dos trabalhadores do setor? Como tem se organizado os educadores enquanto categoria profissional? Como seu trabalho reflete numa política de democratização do acesso aos museus para os diferentes grupos sociais? No momento atual de nossa história, podemos inferir que os museus que não possuem um programa educativo consistente não conseguem dialogar com a sociedade. Um dos pilares da função do museu - a comunicação, se tornou espinha dorsal do setor educativo.

Além de questões organizativas, pode-se apontar que a formação para educadores museais e mediadores (no contexto dos museus de arte), é bastante difusa e insuficiente. Muitos provêm de cursos das ciências humanas, e desenvolvem sua função baseados na prática e na observação de educadores mais experientes. Não há um programa de formação continuada que atenda e discuta as questões específicas do trabalho. Segundo Costa (2019) nos últimos anos os cursos de museologia têm se ampliado pelo Brasil e consolidado políticas de desenvolvimento científico por meio de programas de pós-graduação. No entanto, o recorte que se dá para educação museal ainda é bastante limitado. De modo geral, a formação de educadores museais se dá por meio das instituições e seus cursos de formação que são de curta duração e específicos para cada período expositivo (especialmente quando se trata de museus de arte).

No que se refere à visibilidade do trabalho educativo em museus, de acordo com Honorato (2007), cada vez mais ele tem se tornado uma espécie de marketing cultural para as instituições. Um trabalho considerado muito mais como um serviço prestado do que como uma função específica imbuída de aspectos conceituais próprios.

Instituições de grande porte como Fundação Bienal de São Paulo e Fundação Bienal do Mercosul, desenvolvem trabalhos sistemáticos sobre o campo teórico e conceitual do educativo museal, lançando cadernos e programas de formação, que abrangem desde as questões da arte contemporânea até a mediação prática nos museus. Paralelo a isso, desde 2003 organizam-se redes de educadores museais pelo Brasil (as REMs), reunindo educadores de museus de vários segmentos. As redes se propõem pensar não só os aspectos teóricos e conceituais, como também aspectos organizativos, como perfil de educadores, formação, plano de carreira e formas de fomento ao trabalho educativo em museus. Algumas redes são mais articuladas que outras no cenário nacional, obtendo ressonância na produção acadêmica (como a REM – RJ e REM – BA), outras são bem mais restritas a pautas imediatas e locais.

Contudo, elas foram fundamentais para a elaboração do PNEM (BRASIL, 2010), cujas demandas foram construídas coletivamente, com forte apelo entre os educadores do Brasil inteiro, de forma virtual e presencial (NASCIMENTO; GONÇALVES, 2019).

Esse pequeno retrospecto nos oferece muitos elementos com os quais podemos balizar análises mais profundas. Quais desafios e perspectivas permeiam a atuação desses trabalhadores? Qual o seu perfil no contexto social, cultural e econômico? Como esses trabalhadores se enxergam na política de democratização dos museus e que impactos essa função promove no diálogo entre a sociedade e as instituições?

Além disso, qual tem sido a aproximação da museologia, enquanto campo de produção teórica, com a educação museal em museus e instituições de arte? E invertendo a pergunta: quantos de nós, educadores museais de arte, nos aproximamos da teoria museológica a fim de encontrar ferramentas teóricas para produzir ciência e memória sobre nossa atuação? Por quê ainda existe um distanciamento entre essas duas possibilidades investigativas no mesmo espaço instituído?

Eu acredito que os educadores museais desempenham um importante papel de tensionamento dos museus frente às demandas populares, com grande poder de construção de narrativas contra hegemônicas dentro de instituições tradicionais, favorecendo a inclusão de novas memórias, estéticas e perspectivas políticas. Dentro desse contexto são sujeitos, com suas identidades culturais (HALL, 2005), seu papel instável e precarizado no mercado de trabalho, e constroem a partir de si, a experiência do encontro com o outro.

Referências usadas no texto e para refletir sobre o tema ;)

BARBIERI, Stela. Territórios Educativos. Revista Trama, 2013. 

BARBOSA, Ana Mae. Arte-Educação no Brasil. Ed: Perspectiva, 7ª edição, 2016.

BRASIL. Caderno da Política Nacional de Museus. Brasília, DF: Ministério da Cultura, 2003. BRASIL. Caderno da Política Nacional de Educação Museal. Brasília, DF: IBRAM, 2010. 

CASTRO, Fernanda Santana Rabello. Construindo o campo da educação museal: um passeio pelas políticas públicas de museus no Brasil e em Portugal. Tese de Doutoramento, Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Educação. Niterói, 2018. 

COSTA, Andréa Fernandes. A formação inicial e continuada de Educadores Museais:  projeto em construção. Revista Docência e Cibercultura, v.3, n.2, 2019. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005. 

HELGUERA, Pablo (org). Caderno de Medição. Porto Alegre: Fundação Bienal do Mercosul, 2011. 

HOFF, Mônica. Como (no) repensar los museos em tiempos tan impressionantes. In: Repensar los Museos. III Congresso Internacional Los Museos em la Educación. Museo Nacional Thyssen – Bornemisza, 2016. 

HONORATO, Cayo. Expondo a mediação educacional: questões sobre educação, arte contemporânea e política. ARS (São Paulo), 5(9), 116-127. 2007. NASCIMENTO, M. R; 

GONÇALVES, L.C. Educação museal em rede: surgimento e atuação das redes de educadores em museus no Brasil. Revista Docência e Cibercultura, v.3, n.2 p. 146, 2019. 

PRATES, V. P. T.; VOLZ, J. Incerteza Viva - processos artísticos e pedagógicos em arte e educação. 1. ed. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo, 2016. 

SILVA, Amanda Moreira da. A precarização do trabalho docente no século XXI: o precariado professoral e o professorado estável formal sob a lógica privatista empresarial nas redes públicas brasileiras. Tese de doutoramento. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Educação. Rio de Janeiro, 2018. 

TERRERAS, Rufino. Trans. In: Repensar los Museos. III Congresso Internacional Los Museos em la Educación. Museo Nacional Thyssen – Bornemisza, 2016. 


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